Lógica epistêmica e doxática, ensaio introdutório.

A lógica epistêmica pode ser concebida se substituirmos o operador de necessidade, numa lógica modal alética, por K. Nesta interpretação, K significará “sabe que”, ou, “conhece que”. Este operador será acompanhado de um subscrito que indicará o agente do conhecimento, p. ex., Kap, pode ser interpretado como, “a conhece que [sabe que] p”. Onde p pode ser substituído por qualquer sentença asserível. Para cada agente x, teremos um operador K. O operador K é binário e intencional. Por ‘intencional’, entendemos aqueles operadores que não são extensionais. Por ‘extensional’, entendemos aqueles operadores cujos quais, acrescentando-se uma proposição p, o valor de verdade da proposição complexa resultante, depende apenas do valor de verdade de p. Vemos que o operador de conhecimento, neste sentido, é intencional, no exemplo que segue. Seja p a proposição “10+15=25”. Façamos com que ‘a’ designe o agente referente à descrição definida “meu primo de dois anos”. A fórmula bem formada, adicionando o operador K, é Kap, que se traduz por “meu primo de dois anos sabe que 10+15=25”. Esta afirmação é presumivelmente falsa, mesmo sendo ‘p’, em si, verdadeira.
Definido o operador K, podemos agora definir outro operador da lógica epistêmica, P.
Pa = ¬Ka¬p
Pa pode ser lido, então, como “a não sabe que p não é o caso”. Novamente, para cada agente x teremos um operador P.
Podemos ter também, a lógica doxática, que é parte integrante da lógica epistêmica, se substituirmos o operador de necessidade, numa lógica modal alética, por B. B, assim como K, é binário e intencional e pode ser lido como “acredita que”. Bap pode ser lido como “a acredita que p”. Onde ‘a’ é um agente de crença e ‘p’ uma sentença judicável. Para cada agente x, teremos um operador B. Vemos que B é intencional, no sentido antes citado, no exemplo que segue. Seja p, a proposição, “a Terra gira em torno do Sol”, e, o agente ‘a’, Ptolomeu. A fbf formada, acrescentando-se o operador de crença, é “Bap”. Essa fbf é traduzível como “Ptolomeu acredita(va) que a Terra gira(va) em torno do Sol”, o que é falso, embora p seja verdadeira em si, visto que Ptolomeu acreditava exatamente no contrário (CF. Claudius Ptolomeu, Almagesto).
Podemos, agora, definir o operador de crença ‘C’.
Ca = ¬Ba¬p
Ca pode ser lido, então, como, “a não acredita que p não é o caso”, e, para cada agente x, teremos um operador C.
• Semântica.
Para além das estipulações feitas acima, a semântica da lógica epistêmica e doxática se completam com o acréscimo da semântica da lógica modal alética.
Temos:
Letras proposicionais:
Constantes individuais: a, b, c, d,…, a1, b1,…
Variáveis individuais: x, y, z, x1, y1, z1,…
Variáveis de predicados: q, r, s…
Constantes de predicados: Q, R, S…
Operador monádico: ¬
Operadores diádicos: &, V, → e ≡ (obviamente já estabelecemos os operadores K, B, P, C).
Operadores diádicos para acessibilidade:
‘E’ será o operador para acessibilidade epistêmica e ‘D‘será o operador para acessibilidade doxática.
Tendo acesso a um mundo possível, certo agente epistêmico pode acessar todos os outros mundos possíveis que mantenham uma relação de acessibilidade com o primeiro mundo em questão.
Parênteses: ()
• Sintaxe
1- Toda letra proposicional é fbf (fórmula bem formada).
2- Se α é fbf, ¬α será fbf.
3- Se α é fbf e β uma letra proposicional referente a indivíduos, então, Kβα, Bβα, Pβα e Cβα, serão fbf’s.
4- Se * é um operador diádico e, α e β, são fbf’s, então, (α*β) será fbf.
5- Nada mais será fbf.

• Regras
Epistêmica:
Como regras no sistema temos as regras subjacentes em um sistema modal alético S4, com algumas diferenças na nomenclatura. Temos: Regras proposicionais, negação modal, PR, KR, Reflexividade e Transitividade.
Somando-se a essas, temos: (onde w e v são metavariáveis para mundos possíveis).
KPN: ¬Kxα(w) ˫ Px¬α(w) e ¬Pxα(w) ˫ Kx¬α(w);
PR: Pxα(w), wExv ˫ α(v); KR: Kxα(w), wExv ˫ α(v)
KT: Kxα(w) ˫ α(w); KKR: Kxα(w), wExv ˫ Kxα(v);
TrKR: KxKyα(w) ˫ Kxα(w).
As duas regras KPN são semelhantes às regras de equivalência entre necessário e possível.
As regras PR e KR são muito similares às regras de possibilidade e necessidade no sistema de Kripke.
A regra KT pressupõe a reflexibilidade no sistema e, KKR, a transitividade. Logo, temos o sistema S4 como base.
TrKR é chamada de “regra de transmissibilidade do conhecimento”. Ela diz que, se x sabe que y sabe que α, então x sabe que α.
Os principais axiomas da lógica epistêmica são estabelecidos por:
K1: (Kx(X→Y)→(KxX→KxY)) – Axioma distributivo.
K2: (KxX→X) – Axioma da verdade.
K3: (KxX→KxKxX) – Axioma da introspecção positiva.
K4: (KxKyX→KxX) – Axioma da Transmissibilidade do Conhecimento.

Doxática:
Como regras no sistema temos as regras subjacentes em um sistema modal alético S4, com algumas diferenças na nomenclatura. Temos: Regras proposicionais, negação modal, CR, BR, Reflexividade e Transitividade.
Somando-se a essas, temos: (onde w e v são metavariáveis para mundos possíveis).
BCN: ¬Bxα(w) ˫ Cx¬α(w) e ¬Cxα(w) ˫ Bx¬α(w)
CR: Cxα(w), wDxV ˫ α(v), onde v é novo no caminho.
BR: Bxα(w), wDxv ˫ α(v)
BBR: Bxα(w), wDxv ˫ Bxα(v)
BCR: Bxα(w) ˫ Cxα(w)
Os principais axiomas da lógica doxática são estabelecidos por:
B1 (Bx(X→Y)→(BxX→BxY) – Axioma distributivo.
B2 (BxX→¬Bx¬X) – Este axioma diz que, da crença de um agente em algo (x), se segue sua não crença na negação desse algo (¬x).
B3 (BxX→BxBxX) – Este axioma diz que, da crença de um agente em algo x, se segue que este agente acredita que acredita em x.

• Problemáticas
Bem, como quase tudo na Filosofia, a lógica epistêmica e sua funcionalidade não são totalmente indiscutíveis.
O primeiro destaque é para o Axioma da introspecção positiva: (KxX→KxKxX).
Este axioma diz que se um agente x conhece algo X, então, esse agente conhece que conhece X. Muito se argumenta a favor da invalidade desse princípio, uma vez que, um agente x pode conhecer algo (X) sem, necessariamente, conhecer que conhece, pois, para tanto, este agente deveria possuir noção do conceito de conhecimento, o que nem sempre é o caso.
Outro axioma problemático é o Axioma distributivo: (Kx(X→Y)→(KxX→KxY)).
O problema aqui seria a pressuposição do conhecimento, por parte do agente x, de uma série de regras lógicas. Em outras palavras, é pressuposto a omnisciência lógica do agente, o que é controverso.

• Agentes

Em lógica epistêmica é necessário definir o nível de ciência do agente ao estabelecer as regras de acessibilidade entre os mundos e axiomas no sistema. Para isso são definidos três tipos de onisciência: lógica, dedutiva e factual. A onisciência lógica se divide em dois tipos, forte e fraca. Quando forte o agente conhece todas as verdades lógicas do sistema, a onisciência lógica fraca possibilita ao agente conhecer automaticamente somente as verdades lógicas da lógica de primeira ordem. Já a onisciência dedutiva consiste em que o agente conheça todas as consequências das verdades já assumidas. A onisciência factual permite que o agente conheça todas as verdades do sistema.
Para que o esses tipos de onisciência sejam regulados é preciso definir as regras de acessibilidade e axiomas do sistema.
(Retomando) Em S5 temos as regras:
K1: (Kx(X→Y)→(KxX→KxY))
K2: (KxX→X)
K3: (KxX→KxKxX)
K4: (KxKyX→KxX)
O agente S5 tem onisciência lógica forte e onisciência dedutiva, além de saber o que conhece e o que não conhece.
O agente S4 é muito parecido com o S5 e carrega os mesmos axiomas, com exceção de K5, o que possibilita que o agente S4 possa ter não saber o que não conhece. Ter falsa crença sobre seu próprio conhecimento.
O agente T tem os mesmos axiomas de S4 com exceção de K3, ou seja, este agente pode enganar-se sobre aquilo que sabe.

Lucas Vargas.

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